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Monday, January 17, 2005

Tenho uma bola vermelha que levo para o monte no dia do piquenique.
Uma bola que reflecte a minha face quando a olho
e se cola a mim quando a agarro com força.
E tenho uma cesta de palha que olha a bola de lado
num ciume poderoso de confiança e cumplicidade.sorrindo.
Nesta cesta de palha que sobrevive (como eu gosto)
guardo os segredos do Universo.
Está ainda carregada de embrulhos brilhantes de aluminio
que reluzem uma refeição mágica.guardada por sombras
de gigantes que não se mexem.
Descubro a sande de fiambre e manteiga:
espalhara-a com cuidado. A quantidade certa.
o fiambre diziam que era de boa qualidade."com: boa cor".
A viagem alterou um pouco a sande. achatou-a,
deslocou o fiambre:
observo surpresas escondidas em cada pormenor.

Deitado em cima da toalha aos quadrados
rodeado de erva verde e humida e de barriga para cima
vejo agora a sande aproximar-se de mim
em momentos de entrega ao meu corpo.Como.
por instantes o corpo deixa de ser meu. o ceu azul cerra os olhos.
Então a sede surge e enlouquece a minha imaginação.
Faz-me desejar sentir a minha passividade
face à mais terrivel das chuvas.Ali.
intocável. invencível.com a
salvação do universo nas minhas mãos.secreta.
Levantado do chão, agarro a bola vermelha.
Guardo a toalha. Guardo a cesta.e fecho
as portas do carro.que batem com força.
Seguro a bola. sinto que gosto dela.
Num rasgo de energia chuto-a com toda a força e corro para ela.
repito-me em ciclos de loucura ousando que alguém me veja
rir-me com a minha bola.vermelha.

Saturday, January 01, 2005

O ultimo dia do ano não tem tempo:
o relógio pára na espuma das ondas
que repetidamente desaparece na areia.
Os meus passos arrastam memórias
em sulcos entranhados de decisões
e a tarde acompanha o sol espelhado no mar.

Pela manhã, calcei as minhas botas
mais confortáveis.e enterrei os pés no quintal.
Ao lado da laranjeira ergui-me
com braços de ramos verdes a sentir a brisa.
O copo de limonada estava junto a mim
sobre um banco de madeira pintado de azul claro.
Do baú tinha já retirado o papagaio multicolor
que agora esvoaçava agarrado à perna do banco.
Lembrava-me as mil cores da minha infancia:
canetas de feltro em riscos irreversíveis.livres.
O sabão cor de rosa guardado para dias especiais
estava já no lavatório. junto a uma toalha lavada, verde alface.

Tinha os pés quentes.Gostava de me sentir
preso à terra.entregue aos deuses das árvores.
Fechava os olhos de tempos a tempos
e sentia seiva surgir na folhas verdes.sentia
folhas planarem sobre mim
e cores, laranjas, pesarem-me no coração.
Ouvia a minha mãe dizer que eram boas laranjas.

O rádio tocava em "repeat"
a musica que me acordara pela manha
e exaltava uma noite para comemorar.
Tinha deixado sardinhas frescas à porta do quintal:
os gatos sorriam bigodes deliciados.
depois deste dia nunca mais os veria: talvez no ano seguinte.
Gostava deles assim.

A tarde, na praia, ofereceu-me a noite,
que se aproximou com olhos tintos de vinho
na mesa com toalha branca e
uvas passas.
Estava tudo preparado.
a lenha para a fogueira escondia-se num cesto velho que encontrara na garagem.
Não comi as uvas passas. mas acendi a fogueira no quintal
e adormeci em memórias trémulas de chamas
que me aqueceram a noite.

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